Olá pessoal!
Essa postagem era para ser entregue na semana passada, mas a vida, a vida o que é diga lá meu irmão etc e tal.
Assim como o desafio literário, na hora do <vamo vê> da vida a gente faz o que dá, como dá. As gambiarras, truques, roubadas, empurradas de barriga: tudo faz parte. O primordial é seguir, porque talvez a única certeza é que ali na frente, outras tretas, imprevisões, desafios e surpresas nos aguardam.
Dito isso, você pode conferir abaixo alguns dos textos das participantes do nosso grupo exclusivo - a novidade do Literoutubro desse ano. Se a informação está chegando para você nessa edição, volte uma casa e leia aqui.
Vamos de semana 01?
Márcio Melo
Jireh, sencientes do espaço profundo! "Vórtice Veludo" com duas UAs de potência chegando até a borda exterior, menos para Tenaris que não tem licença para humor. Hoje vamos descobrir o valor da liberdade e também qual a melhor cor de guarda-sol para evitar radiações. Todas, morra deslumbrante.
Se você acreditava que seu dia estava chato, é porque ainda não ouviu nossa programação!
A confederação de Visgovolley suspendeu a 237o copa intergalática por conta da greve dos Gliberantes de Keplex-13. Segundo elus, mesmo que o contato entre seus visgos corporais e outros seres aconteçam apenas com a bola, ainda assim precisa do consentimento de todo seu planeta. O campeonato será substituído pelas corridas no vácuo, o esporte mais rápido do universo.
Os Gatursos de Lupéria, nossos sanguinolentos mascotes, foram declarados extintos... de novo. Sem agonia, já estão sendo encomendados novos em Aestheris.
Liberdade. Aquilo que todo mundo quer, mas ninguém sabe bem o que fazer com ela. Em Covarth custa apenas 50.000 créditos. Um negócio de Lurdus... se ainda existisse Lurdus.
"Grunzok 'Vórtice Veludo'! Não disponho dessa quantia" .
Venda órgãos para as zonas científicas e ganhe uma Liberdade Condicional Premium. É como se fosse liberdade, mas sem a parte chata de tomar decisões. Nanorobôs fazem isso por você – dizem onde ir, com quem dormir, qual esporte assistir e quem ofender enquanto estiver laborando.
Para quê aguentar a barra de ser livre se você pode fingir seguindo um script previamente escolhido? Liberdade custa caro, mas a ilusão é quase de graça!
paulamaria
joguei pedras no caminho
para não me perder na volta
a estrada
era via de mão
única
que não para de passar gente
que por acaso também deixou
suas pedras
e nunca pode voltar
apenas
seguir
meu retorno
é o futuro
de quem
ainda
está porvir
Andrea Rezes
/Futuro/
Distopia de um só dia
De um Futuro com furo
De um dilema sem brecha
De uma força obsesa
De um tudo dentro do todo
De um corredor de ouro
De ti e de de nos escala e foice
Foi um dia aquele dia
Foi uma noite no horizonte
É um dia que não dormia
E foi tudo e foi tanto
E foi verso e foi guia
Me apresentei na distopia da alegria
De um otimismo cego em um juízo paralelo á palavra craseada
Há uma certa cacofonia
Nem quiz ler o jornal
Não quiz amanhecer a tarde
Era um otimismo cego que valia
Nem sempre nem as vezes nem quando doía
Mas decidi então que era que sim é que era coherente
Escovar os dentes para uma nova mordida de tesão embrenhada na não razão
E brincava com as palavras de futuros que criava
E podia
E achava
E ría
Sem
Nostalgia
E brincava e corria
E achava que tudo nada sabia
Então um dia um belo dia
Acordei e decidi e vi e senti que tudo era só isso
Decidir seguir e me negar a não acreditar que sim é possível um novo futuro criar
Onde?
No único lugar urgente
Agora
No presente
Denise Gals
À escrivaninha. 26ºC lá fora. O céu está encoberto, prometendo pancadas de chuva. Adoro esse frescor primaverl!
Imagino um mundo onde as pessoas podem se expressar livremente, viver sem medo e realizar seus sonhos sem nenhuma restrição. Para mim, esse lugar chama-se “aposentadoria”. Sim, pode acreditar!
Vejo a aposentadoria como o momento perfeito para, finalmente, fazer tudo o que sempre quis e nunca tive a chance. Com minha personalidade impulsiva, mergulhei de cabeça nesse novo capítulo da minha vida. Cada atividade que escolhi tem um propósito claro e alimenta minha alma de uma maneira única.
Ter a coragem e o discernimento para escolher o que é melhor para nós na aposentadoria é libertador.
Mas, vamos ser realistas. No mundo em que vivemos, para muitas pessoas, essa fase pode ser cheia de incertezas e dificuldades. Em vez de ser um período de descanso e de realização pessoal, enfrentam desafios financeiros e falta de oportunidades, o que limita suas escolhas.
Quem dera essa fosse a realidade para todos, em um mundo ideal onde tal liberdade de escolha fosse garantida compulsoriamente.
Livia Reis
Era setembro de 2027 quando gritos masculinos ecoavam nas paredes do Congresso Nacional. Depois de tanto insistirem, finalmente aprovaram. Conseguiram tornar ilegal o aborto, em todas as suas formas.
ACABOU O ASSASSINATO DE BEBÊS PORRA, eles bradavam.
Laura assistiu à sessão enquanto corrigia provas e se perguntava de que adianta tanto esforço para tentar ensinar. Ligou para a avó e avisou que a busca pelos seus serviços provavelmente aumentaria.
Dito e feito. Em poucos meses Amarilis precisou recorrer à sua rede secreta de contatos para repor alguns ingredientes utilizados na mistura de fazer vir a menstruação. Sabia que o ofício de todas elas estava em risco, mas não podia deixar de ajudar quem a procurava. Apesar de tudo se sentia segura em seu sítio pois era um nome importante na comunidade, sabia muita coisa e tinha salvado a vida de muita gente. Ninguém ousaria atentar contra ela.
Certa noite uma moça bateu desesperada à sua porta. Cabelos loiros, pele pálida, olhos grandes e azuis, aparentava vinte e poucos anos. Chorava muito e suas palavras quase não faziam sentido, repetia incessantemente que só queria esquecer, que precisava tirar dela a lembrança do que havia acontecido. Amarilis lhe serviu um chá de camomila, sentou na cadeira de frente a ela, estendeu as mãos até o meio da mesa. A moça engoliu o chá com pressa, assim como engoliu o choro, colocou as mãos por cima das da anciã e sussurrou: por favor, me ajuda. Saiu de lá duas horas depois, com um saquinho de pano na mão e orientações sobre o que fazer com o conteúdo.
Passadas duas semanas, soube por Laura de um inquérito aberto na delegacia local. Uma jovem foi internada após ter a gestação interrompida por complicações que os médicos desconfiaram que não fossem naturais. A investigação corria em sigilo e, apesar da previsão legal de prisão preventiva imediata para suspeitos de crime contra a vida, não foi o que aconteceu com a moça, que logo após a alta hospitalar foi encaminhada para uma instituição psiquiátrica de luxo.
Amarilis de imediato identificou quem era, mas não disse nada. Se levantou do sofá, recolheu as xícaras de café e foi para a cozinha, deixando a neta falando sozinha na sala. Teve dificuldade para dormir naquela noite, nem o mulungu a impediu de revirar na cama a todo instante. Antes da alvorada já estava de pé como de costume, mas ficou em dúvida se saía para regar as plantas. Preferiu ficar na cozinha, ferver o leite e esperar o sol nascer.
Às 06:01 abriu a porta e parou ao pé da escada da varanda com o regador na mão. Às 06:02 um carro estacionou e dois homens saíram, nas mãos do que veio na frente uma Glock e uma folha de papel ofício. Esticou o braço com o papel no rosto de Amarilis enquanto apontava a arma com o outro. Mais atrás, também com arma em riste o outro gritava: Mexeu com as pessoas erradas, bruxa velha.
Depois disso, não viu mais nada.
Taty Guedes
Já fui ingênua a ponto de colocar minha esperança num pedaço dobrado de papel: um bilhete, uma carta, uma receita, um cheque, um voto.
Cresci e não sei onde colocá-la. Não é nas crianças, não é nos políticos, nemem mim mesma. Fico segurando, desajeitada, essa coisa amorfa que anda meio apagada, meio cinza, parecendo nuvem pronta a desaguar.
Grécia Augusta
O CONHECIMENTO É…
Todos os dias o pássaro acordava, tomava sua água, comia sua ração, dava uma volta em sua jaula e voltava, triste, para o mesmo lugar.
Ele olhava para fora da janela. Vez ou outra via outras aves voando ali e acolá, pousando em galhos.
Ele cantava, um canto sentido, um tanto dolorido. E assim era todos os dias. Era a sua rotina de lamentação.
Até que um tempo se passou e um outro pássaro pousou perto da janela e o avistou. Eles trocaram olhares por alguns minutos e então o outro pássaro disse:
— Ei, saia daí. Voe. Fuja. Você não pertence a este lugar.
— Eu estou preso. E eu não sei voar.
— Você sabe. Só não sabe que sabe.
Por dias esse mesmo diálogo ocorreu. Cansado, o outro pássaro deixou de visitá-lo. O pássaro da jaula então percebeu que a portinhola nunca esteve trancada. Era só um pequeno empurrão e… pronto. Ele sairia dali. E assim o fez.
Lisandro Gaertner
Medalha de ouro
Depois de três dias firmes na promessa de não fumar, recaiu. Ou quase.
Acordou agitado, no meio da noite, com a garganta coçando e a língua dormente por um cigarro; de um sonho sobre um bar de jazz com buffet de café da manhã em que todos ainda podiam fumar em espaços públicos e fechados. Bons tempos, bons tempos.
Foi nos esconderijos tradicionais, onde guardava maços para descumprir suas próprias resoluções de não mais fumar, mas não encontrou nem uma guimba de Medalha de Ouro, seu mata rato preferido. Da janela, procurou as luzes dos botequins debaixo do seu prédio, mas parecia que todos estavam fechados. Só lhe restava, de esperança, a banca 24 horas da esquina da Barão do Flamengo. Se ela não tivesse cigarros, ou, por um milagre infernal, estivesse fechada, teria que ir até ao posto da Ruy Barbosa ou da Farani. Ato que envolvia, na sua opinião, maiores riscos para a sua saúde do que um possível câncer de pulmão.
Colocou um short, chinelos, uma camiseta rasgada, que o confundisse com a população de rua local, e, no bolso, levou apenas o dinheiro contado pra dois maços. Celular, documentos, carteira, por precaução, ficariam em casa.
Passou pela portaria discretamente para não acordar o porteiro nem passar vergonha de sair vestido de cosplay de mendigo. Atravessou a praça do Largo do Machado quase marchando, num misto de bravura e medo que, esperava, fosse protege-lo de possíveis assaltantes. Acelerou o passo na rua do Catete e já da entrada, fechada, do metrô, conseguiu ver a luz branca da banca. Havia uma esperança, havia uma esperança.
Atravessou o sinal aberto entre as poucas motos de entregadores de aplicativo que cortavam o asfalto, jogando gás carbônico na atmosfera, e levavam as últimas refeições cheias de ingredientes ultra processados aos insones, e em dois pulos estava no seu destino.
Atravessou a pequena multidão de boêmios que fumavam seus últimos cigarros e tomavam a saideira na banca depois que os bares do Flamengo já tinham fechado, e, de dedo em riste, revelou seu desejo ao mundo:
-Tem Medalha de Ouro maço?
-Tem. Branco ou Vermelho?
-Vermelho!
O jornaleiro trouxe o maço de Medalha de Ouro vermelho, e, desconfiado do cliente maltrapilho, o segurou à distância até ver o dinheiro. Ele entendeu o recado e buscou a grana no bolso. Não encontrou. No seu lugar havia apenas um furo. Assim como a camisa, seu short também estava rasgado.
Nem se dignou a explicar nada. Abaixou a cabeça e, entre os boêmios, que bebiam e fumavam, se deixou caminhar para casa, olhando para o chão, na esperança de encontrar o dinheiro perdido. Não encontrou.
Chegou na portaria do prédio e lembrou que esqueceu de trazer a chave. Bateu no portão e nas grades de ferro, mas o porteiro nem se abalou. Que remédio? Teria que esperar ele acordar naturalmente ou algum morador sair pra trabalhar na madrugada. Se não tivesse perdido o dinheiro, não saía da sua cabeça, pelo menos poderia esperar fumando, como naquele velho tango: “Fumar es un placer/ Genial, sensual/ Fumando espero”…
Sentou-se na escadaria do edifício e tudo o que podia sentir era ódio. Ódio de si, por fazer tanto esforço pra se matar; ódio da raça humana, por fazer tanto esforço pra se matar entre si. A extinção, pensou, devia ser um esporte olímpico, com categorias tanto coletivas, como individuais. Todas as nações, e todos os seres humanos empatariam em primeiro lugar. Medalha de Ouro para todos nós.
E aí, curtiu? Ainda não está participando? Começou a fazer e parou? Animou? Reanimou?
Apesar já estarmos na reta final, sempre é hora de começar a participar. Clique aqui e venha fazer parte dessa loucura!
Semana que vem, chegará na sua caixa de entrada a semana 02.
Um abraço e boa escrita!
São os desejos da
Toranja ILTDA.
Vale tudo pra honrar o desafio. Muito bom!
fica muito legal quando esão todos juntinhos